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"Bola rebola" demorou a rolar. A música reúne Tropkillaz, Anitta e MC Zaac, parceiros do hit "Vai malandra", além do colombiano J Balvin. Mas a criação e o resultado foram bem diferentes.

A composição partiu de um som insólito do Japão, demorou mais de um ano para terminar e teve muito vai e volta entre a equipe até o quebra-cabeças de vocais em português, inglês e espanhol ser montado.

No fim, é música pop simples e que gruda na cabeça (especialmente o tal som inicial). Mas por trás dela há histórias que ajudam a entender o processo criativo do funk, a dinâmica dos "feats" na música atual e o que se espera do pop brasileiro no mercado mundial.

1. Laudz, metade do duo Tropkillaz, estava "brisando" no estúdio, experimentando sons. Ele achou por acaso o som sintetizado de uma flauta japonesa chamada hichiriki.

2. Achou o som diferente, brincou com ele (sem saber da origem) e criou refrão de funk junto com MC Zaac. Eles viram potencial, buscaram parceiros, mas levaram um ano para terminar.

3. Anitta entrou na empreitada e sugeriu chamar J Balvin. O Tropkillaz teve que montar um quebra-cabeças de vocais trilíngues com a exigente Anitta. Foram 12 versões até a final.

4. A montagem busca um formato pop sem tirar a originalidade do início. Outro desafio foi falar com o possível público brasileiro, hispânico e de outros locais ao mesmo tempo.

1 - Flauta estridente que mexe com a gente

Laudz buscava timbres novos quando achou no teclado uma reprodução do hichiriki, flauta japonesa de origem chinesa, semelhante a um oboé. O hichiriki é um dos instrumentos "sagrados" usados há séculos no gagaku, tipo de música presente em cerimônias xintoístas, como casamentos.

Mas ele não sabia de nada disso. O produtor só procurava a "estranheza", como de costume. "É uma coisa que a gente usa em nossas músicas. Barulhos estranhos", diz. A tal flauta alterada virou de longe a coisa mais marcante no arranjo.

O Tropkillaz busca "sempre um barulho esquisito, que ninguém nunca vai fazer igual, e não timbres prontos", diz o colega Zegon.

O Tropkillaz começou muito ligado ao trap, e tem se aproximado do funk. Essa "brisada" de Laudz é ao mesmo tempo descompromissada e parte do processo criativo de DJs de funk atuais: de brincadeira, acha-se batidas originais para se destacar da concorrência.

A história da flauta que o produtor achou legal - sem saber da origem - lembra a de um dos maiores fenômenos do funk de SP: a "flauta envolvente" de "Bum bum tam tam", de MC Fioti.

Para brincar com o som estridente, Laudz chamou outro astro do funk de SP: MC Zaac.

Lauz e Zaac continuaram "brisando", viajando no som, e gravaram um refrão. Esse trecho apareceu ao show deles do Lollapalooza SP 2018. Eles chegaram a procurar parceiros gringos para gravar a faixa.

Mas dois meses depois, em maio, Anitta ouviu a música e entrou no time da "Bola"…

2 - Uma equipe malandra

O interesse de Anitta pela música levou à reunião de um time que deu certo em "Vai malandra": ela, Tropkillaz e Zaac. Só ficaram de foram o DJ Yuri Martins e o rapper Maejor. No lugar, entrou o astro colombiano do reggaeton J Balvin.

Mas a música não é uma "Vai malandra - parte 2". A diferença vem da origem. A primeira parceria partiu de uma criação inicial de Yuri e Zaac - tanto que a base do funk lembra "Vai embrazando", sucesso da carreira solo do funkeiro.

Já "Bola rebola" tem origem total no Tropkillaz. Mas quem são eles? O duo une o veterano paulista Zegon, 50 anos, que já tocou no Planet Hemp e com Racionais e Sabotage, ao prodígio curitibano André Laudz, 26.

3 - Quebra-cabeças do 'feat'

No final de 2018, os Tropkillaz foram a Nova York encontrar Anitta e gravar os vocais dela. J Balvin registrou sua parte da Colômbia mesmo. Depois, o duo penou para montar tudo em SP.

Anitta mistura versos em português, inglês e espanhol. Zaac e Balvin também misturam as línguas, às vezes na mesma frase.

A estratégia foi não separar as línguas em "blocos", mas misturar tudo desde o início. "Prender a atenção dos latinos, dos brasileiros, de quem fala inglês. Ficar indo e vindo (com cada vocalista), e ter a batida como marca", explica o DJ.

Zegon diz que eles fizeram 12 versões até finalizar. "Cada um queria uma coisa. Saía daqui, ia para Anitta e o pessoal dela, eles falavam outra coisa completamente diferente do que a gente imaginava", lembra Laudz.

"Ela quis mudar muitas vezes. Ela tem um ouvido foda. Percebe rápido qualquer coisa que saiu da música. Saiu um 'ã ã", ela fala: 'Cadê o 'ã ã?'. E eu não percebi", diz Zegon.

Eles mostram um áudio que Anitta mandou pelo WhatsApp durante a produção: "Sinto falta de um respiro do 'taaaaanaaan'", ela reclama, citando o som da flautinha.

"Realmente o bagulho fica na cabeça, mas a bateria ficou tão forte, que ficou dentro da música. E a versão final foi a que todo mundo ficou contente", comemora Zegon.

Ou seja: o final foi bem mais pacífico do que outras discórdias por áudios de WhatsApp vazadas atualmente.

4 - Onde a 'Bola' vai parar?

Dizer que o Tropkillaz faz "pontes entre eletrônica, rap, funk e pop" foi literal aqui. "Bola rebola" também ganhou uma ponte (trecho de uma música que liga os versos ao refrão) com violão e base mais pop - um dos "respiros" da batida principal pedidos por Anitta.

E o equilíbrio não foi só de línguas, mas de expectativas. O Tropkillaz participa de muitos festivais e eventos de música eletrônica no exterior. A presença lá fora era tanta que eles tinham contrato assinado com a Universal na França.

Mas eles querem fincar a bandeira aqui também. Em 2018, articularam troca de contrato para a gravadora no Brasil. O período também foi de preparar muitos lançamentos para 2019: "A gente está com muita música pronta, trabalhou o ano passado inteiro, sem parar", diz Zegon.

Ao mesmo tempo, o Tropkillaz continua ligado no potencial do funk brasileiro no exterior, já que continua a circular pelo mundo - entre esta entrevista e o lançamento, foram tocar em um festival na Índia.

"Quando a gente toca um beat de funk lá fora, todo mundo curte. Então a gente trouxe nosso estilo, nosso peso, nossa forma de cortar os barulhos, e encaixou no funk. Achamos nosso estilo, esse está sendo nosso caminho", diz Zegon.

Some-se a este potencial da música fora do Brasil a performance de J Balvin. "Ele não mandou qualquer coisa. O Balvin faz metáforas e fez versos de um bom rapper". Pode ser um reflexo da aproximação crescente do reggaeton com o trap.

De quebra, os gráficos mostram que quando J Balvin e Anitta se encontram, a audiência sobe. A conferir se a faixa que começou com a "brisada" de Laudz terá o mesmo fim.

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